quarta-feira, 13 de maio de 2009

O Senado e os indicados para o CNJ e o CNMP


Assisti hoje à sessão da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado (CCJ), que deveria servir para a sabatina, pelos senadores, dos indicados pelos tribunais e organizações profissionais do sistema de justiça para a terceira composição dos Conselhos Nacionais da Justiça (CNJ) e do Ministério Público (CNMP).
"Deveria servir para a sabatina" - vejam bem. Isso porque o que eu vi hoje reforça um argumento que tenho verificado em minhas pesquisas sobre as elites jurídicas e a composição das carreiras e organizações da justiça no Brasil: o de que o campo jurídico - entendido como o conjunto de instituições, procedimentos, doutrinas e agentes que produzem, operam e dizem o direito - se fecha cada vez mais em si mesmo. Segundo o sociólogo francês Pierre Bourdieu (autor do conceito de "campo jurídico"), isso seria uma tendência de qualquer campo jurídico nacional; mas, quando pensamos no clássico sistema de freios e contrapesos entre os três poderes (dentre os quais se inclui a sabatina pelo Senado) e no próprio papel de "controle externo" a ser exercido pelo CNJ e pelo CNMP, esse fechamento do campo em si mesmo merece reflexões sobre a efetividade de nossos modelos institucionais de democracia.
Afinal, o que vi hoje foi uma sessão meramente protocolar, para fazer cumprir formalmente a previsão de submissão, ao Senado, das indicações aos Conselhos. Na prática, as indicações não foram em nenhum segundo contestadas, e os candidatos sequer foram de fato sabatinados. Os relatores repetiam literalmente as informações apresentadas no currículos dos candidatos, o presidente da CCJ concedia três minutos para manifestação dos indicados, depois perguntava se alguém tinha algum questionamento, e antes que qualquer Senador pudesse ao menos repetir para si mesmo a pergunta ("teria eu algum questionamento a esse candidato?"), o presidente declarava que, não havendo questionamento, suspendia a votação daquele nome, e passava para o próximo indicado.
A "linha de montagem" da sabatina parece ter sido previamente acordada na CCJ, e, pelas justificativas de seu presidente, seria decorrência de um lapso na organização dos trabalhos, que deixou todas as indicações dos dois Conselhos para uma só sessão da Comissão. Eu nunca antes havia assistido a uma sessão de sabatina, e confesso que não assisti hoje à segunda parte da sessão, mas pelo que já soube e acompanhei, pelo noticiário e pelas pesquisas que fiz, mesmo nas sessões dedicadas à sabatina de apenas um candidato (como ocorre com os indicados ao STF), as perguntas feitas pelos congressistas nunca foram suficientes, até onde eu sei, para que o parlamento rejeitasse uma indicação para um órgão do Judiciário.
Na sessão de hoje vozes se levantaram contra a formalidade do teatro encenado. O primeiro foi o Senador Welington Salgado (DEM-MG), que insistiu no ritual e na sonelidade da sabatina, pelo motivo de que o modelo adotado hoje não seria digno do momento, do Senado e das carreiras dos indicados - que, afinal, almejam um assento em órgãos constitucionais da cúpula do sistema de justiça. Depois foi o Senador Artur Virgílio (PSDB-AM), que acompanhado de outras vozes (Tasso Jereissatti, Álvaro Dias, Aloizio Mercadante), contestou o procedimento de sabatina "por lote" de indicados, mas dessa vez deixando claro um motivo mais consistente, além daqueles relacionados à função constitucional do Senado e ao prestígio dos indicados: os poderes do Ministério Público, seu protagonismo nos tempos recentes, e suas relações com o campo político justificavam que o Senado gastasse algum tempo mais na análise e na deliberação sobre as indicações para seu órgão de controle externo.
Alguma discussão depois, o encaminhamento dado foi que seriam concluídas as leituras dos relatórios e currículos dos indicados, e que a delibração seria feita apenas após duas sessões nas quais a CCJ discutiria o papel desempenhado e a função esperada dos dois Conselhos de controle externo. Os indicados foram convidados a comparecer a essas duas próximas sessões da Comissão, mas, perceba-se, o encaminhamento não prevê que a sabatina individual, de fato, seja feita. O que os senadores querem mesmo é discutir o MP e seu efetivo controle externo, muito provavelmente preocupados com as ações mais incisivas (e muitas vezes abusivas) de promotores de justiça e procuradores da República. O CNJ foi incluído nesse encaminhamento apenas pela iniciativa do presidente da CCJ, que ponderou que, se a questão era a necessária deliberação e reflexão sobre a composição de tão importantes órgãos do sistema de justiça, e a efetividade do Senado como a instituição que de fato decide, isso deveria valer para os dois Conselhos.
Na prática, portanto, continuarão valendo como definitivas as indicações feitas pelos órgãos da justiça - e, assim, o controle tende a ficar cada vez menos externo.

Saiba mais:

http://www.conjur.com.br/2009-mai-13/senadores-prometem-sabatinar-indicados-cnj-cnmp-proxima-vez

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