Essa interação, portanto, deve ser analisada levando-se em conta diferenças regionais e as diversas demandas sociais por outros profissionais com formações diferentes: engenheiros, pedagogos, cientistas sociais, médicos, etc. Repensar a política do Estado para o ensino do Direito no Brasil só fará sentido se esse esforço incluir também a reflexão sobre outras formações de nível superior e técnico e suas específicas contribuições a um país em processo de desenvolvimento. O Direito tem seu lugar nesse processo, mas é preciso defini-lo com ponderação e consciência da diversidade de conhecimentos e demandas sociais igualmente relavantes.
É preciso pensar que o Direito é a linguagem oficial do Estado e, portanto, os bacharéis em Direito podem se tornar, quando devidamente qualificados para tanto, os operadores de uma burocracia eficiente na promoção de direitos e democrática em sua relação com a sociedade. Para isso, os cursos jurídicos devem se prestar a um papel mais elevado do que o de preparação formalista para concursos públicos, para se tornarem espaços de reflexões e práticas inovadoras sobre a gestão jurídica do Estado e o papel do Direito na criação e na implementação de políticas públicas.
É necessário, ainda, considerar que a solução pacífica dos conflitos sociais, mesmo quando não encontra caminhos apenas no Judiciário, pode se beneficiar muito dos saberes e procedimentos jurídicos, aplicados à mediação empresarial, familiar e comunitária, à arbitragem e à conciliação. E, mesmo quando os conflitos procuram as vias judiciais para sua solução, é preciso reforçar o papel e as competências técnicas daqueles que lidam diretamente com os conflitos, e que não se resumem à tríade advogado-juiz-promotor; refiro-me, especificamente, aos servidores do Judiciário e de órgãos administrativos de segurança pública, assistência social e defesa do consumidor, atores em geral esquecidos quando se fala de reforma da administração da justiça e do ensino jurídico no Brasil.
Para isso, a interlocução do MEC para reformar o ensino do Direito deve incluir uma gama maior de atores: os Conselhos Nacionais de Justiça (CNJ) e do Ministério Público (CNMP) e o Ministério da Justiça, que possuem dados e projetos sobre a oferta de justiça estatal e alternativa no país; a Escola Nacional de Administração Pública (ENAP), o Ministério do Planejamento e o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA), capazes de produzir dados e pensamento sobre a administração do Estado e a qualidade da cidadania; a Associação Brasileira do Ensino do Direito (ABEDi), as próprias faculdades de Direito e a crescente comunidade de pesquisadores e docentes da área, que têm concepções próprias da produção de conhecimento e do ensino jurídico; entre outros. É urgente, em suma, que a reforma do ensino do Direito no Brasil não leve apenas em conta os interesses de um ou outro grupo profissional ou acadêmico, mas sim que coloque o Direito e seus operadores como os responsáveis por uma ampla concepção de administração da justiça para um Brasil melhor.
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