terça-feira, 4 de setembro de 2007

Eleições na OAB

Saiu no Boletim Informativo da OAB Federal:
OAB cria comissão para estudar sistema eleitoral da entidade
Um dos principais argumentos do trabalho de Maria da Glória Bonelli sobre a advocacia brasileira (Profissionalismo e Política no mundo do Direito, São Carlos, EdUFSCar/Sumaré, 2002, cap. 1) gira em torno da coesão mantida pela profissão em torno de sua dupla vocação (institucional e corporativa), apesar dos conflitos subjacentes a essas duas "missões" da entidade e à inevitável diversificação profissional no interior da classe. Segundo aquela autora, essa coesão, obra dos dirigentes da advocacia e da capacidade da OAB em selecionar e institucionalizar diferentes demandas internas ao grupo, seria decorrência da unidade dos advogados na oposição e abertura do regime militar de 1964, e na sua rápida conversão em cacife político inclusive para propor uma agenda mais corporativa na representação dos advogados.
Entretanto, as fissuras costuradas pelo esforço de unidade dos dirigentes da advocacia parecem vir às claras constantemente nos últimos tempos, especialmente quando se abrem debates sobre a eleição para a diretoria da entidade. Sejam fissuras antigas, sejam novas clivagens, elas demonstram a existência de grupos em disputa no interior da advocacia e, mais uma vez, o esforço de seus dirigentes em compor a divergência e manter a coesão da entidade e da identidade profissional dominante. Nesse sentido, os esforços de coesão apontados por Bonelli por ocasião da elaboração do novo Estatuto da Advocacia (1994), especialmente no que se refere à decisão de então conciliar eleições diretas para as seccionais e indiretas para o Conselho Federal, parecem novamente ser colocados à prova.
Essas fissuras ficaram claras nas duas últimas eleições (especialmente na penúltima) para a diretoria da maior seccional da OAB, a de São Paulo, quando um assunto meramente corporativo ganhou grande destaque na opinião pública, especialmente por conta da intensificação da disputa eleitoral e do reforço dos meios de convencimento de eleitores, cuja dimensão em termos de marketing político não deveu nada ao que vemos em eleições majoritárias ou proporcionais de nosso sistema político. Nessas duas últimas eleições o vencedor foi Luís Flávio Borges D'Urso, que na primeira disputa contou com grande esforço publicitário, e também com maior oposição, inclusive por parte de grupos e nomes tradicionais da advocacia paulista. Na segunda eleição de D'Urso, a composição com os grupos que se opuseram na primeira eleição parece ter sido maior, bem como a preocupação com a entidade em regular o procedimento eleitoral e a campanha publicitária de convencimento de eleitores.
Buscou-se, em síntese, retomar a "discrição" da disputa eleitoral e, principalmente, evitar que a ascenção de um novo grupo de advogados (representados por D'Urso) desestabilizasse demasiadamente a coesão profissional a cada nova eleição, que tornaria evidente aos olhos leigos as fissuras e clivagens internas (um importante dirigente da OAB/SP, membro do setor mais tradicional da advocacia mas que compôs com o grupo de D'Urso, confidenciou-me recentemente, inclusive, que há grande descontentamento por parte desses grupos tradicionais, com as medidas corporativas adotadas pela atual direção, sempre no sentido de atender às necessidades da base da advocacia de massa, sem maiores preocupações com a "elite" da advocacia).
Recentemente, as clivagens se projetaram para o âmbito nacional, por conta da divergência entre as seccionais de São Paulo e do Rio de Janeiro em torno do Movimento Cívico pelos Direitos dos Brasileiros, conhecido como "Cansei". O cerne da divergência estaria na representatividade da seccional de São Paulo por falar em nome dos advogados e da OAB em nível nacional, questionada pelo presidente da seccional fluminense. Para observadores externos, o bate-boca entre D'Urso e seu colega do Rio de Janeiro foi uma antecipação da disputa para a direção do Conselho Federal, que se avizinha, tendo no nome e na vitoriosa trajetória política de D'Urso um forte candidato. Como desdobramento, grupos de oposição à diretoria da OAB/RJ manifestaram repúdio ao seu presidente, e solidariedade à OAB/SP (veja-se, a propósito, série de reportagens sobre o episódio, no site Consultor Jurídico: http://conjur.estadao.com.br/static/text/58495,1).
O fato é que agora o Conselho Federal começa a discutir mudanças no sistema eleitoral da entidade, o que reafirma o esforço de seus dirigentes em se antecipar às divergências e buscar, via reformas institucionais, compor os interesses conflitantes e manter a coesão da profissão. Dentre os temas a serem tratados pela comissão que estuda a reforma, estão a possibilidade de candidaturas avulsas, possibilidade de voto por bancadas e reeleição nas seccionais.

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